O bairro Paraíso, no município de Cacuaco, a norte da província de Luanda, entrou nesta semana no mapa de visibilidade de todos por dois motivos negativos, mas que forçaram os políticos, governantes, músicos e autoridades locais a visitar. Um Paraíso negado aos seus moradores, que querem sempre o melhor. Por um lado, o surto de cólera que colocou o bairro marginalizado como sendo o epicentro da doença e, do outro lado, a morte do jovem cantor Mano Chabba, que pela primeira vez o bairro marginalizado viu um filho seu a sair das cinzas e vencer todas as diversidades da precariedade dos musseques desta Luanda.
Texto: Simão Hossi | Foto: Rafael Massanga Savimbi (no Facebook)
Para além da marginalização que o nome Paraíso apresentava aos seus moradores, o nome tinha o significado inverso nas vidas dos seus habitantes. O bairro emergiu nos anos 90 acolhendo cidadãos provenientes das províncias do Sul de Angola que fugiam da guerra. Para além das suas características de uma zona rural, a sua aproximação a costa marítima foi um dos motivos da escolha daquele Paraíso em Cacuaco que sempre representou inferno aos munícipes.
Anos depois, o Paraíso passou a receber de braços abertos todos aqueles que por alguma situação de vida não tinham outras escolhas e opções em encontrar um Paraíso diferente em zonas nobres e privilegiada, a não ser aprenderem a lidar com as adversidades e desafios que a zona colocava aos que de forma voluntária ou obrigatória tinham que apostar tudo a procura de sossego e tranquilidade.
A cólera que aí emergiu é parte dos riscos de vida a que as pessoas estão submetidas, tal como a insegurança, difícil acesso, falta de serviços públicos, serviços notariais e bancários, falta de água potável, ausência de saneamento básico e todos os males que surgem em época das chuvas. Uma realidade que não é desconhecida das autoridades administrativas local, municipal, provincial, à semelhança de outros bairros marginalizados do País.
Paraíso sofre duplamente por estar geograficamente no município do Cacuaco, supostamente o bastião do maior partido político na oposição, UNITA, por esta razão, alegam alguns moradores, é que o subdesenvolvimento de Cacuaco afecta mais gravemente este pedaço do território nacional. As autoridades administrativas de Cacuaco aproveitam as oportunidades orçamentais para dar visibilidade apenas à Vila Sede. O Paraíso sempre foi negado aos seus filhos e àqueles que escolheram aquele bairro para viver.
Mano Chaba, o Poeta do Paraíso, como apelidado pelo jornalista e escritor Sousa Jamba, sobreviveu a todas as adversidades que o seu Paraíso lhe proporcionou, filho de pais provenientes do Sul e educado num ambiente religioso. Renasceu das cinzas do Paraíso por intermédio da arte. O tempo de glória de Mano Chabba durou pouco para ele. Faleceu exactamente quando estava a atingir o auge da sua carreira na música.
Chabba em pouco tempo de fama teve que lidar também com as adversidades ocultas que o mundo da música e da fama proporcionam a si e seus familiares e amigos. Chegou a alcançar parte dos seus sonhos, ao ajudar a transformar aquela realidade negada por todos, mas ele e os seus tiveram que enfrentar de forma firme até o fatídico dia 21 de Janeiro de 2025, quando, em companhia de seus amigos, decidiram refrescar-se na praia da Ilha de Luanda, diversificando a conhecida de Cacuaco, menos atractiva para uma figura ilustre e pública como ele se tornou com muita resiliência.
O seu desaparecimento físico surpreendeu a todos os que já o conheciam e aos que ficaram a conhecê-lo naquele dia do trágico incidente, que resultou na sua morte minutos depois de ter partilhado com os seus fãs e seguidores a sua felicidade na rede social. Hoje, com a sua morte coloca de forma involuntária o seu Paraíso a ser visitado até por aqueles que sempre se negaram a alterar a condição que ele e milhares de angolanos enfrentam. Líderes juvenis dos partidos políticos, cantores, administrador municipal e governador provincial tiveram de ir ao bairro Paraíso para prestar homenagem ao artista, quando sempre negaram que aquele bairro era um inferno. À semelhança das figuras públicas, políticos e jornalistas que se deslocaram ao bairro marginalizado para render homenagem aos filhos do Paraíso que partiram para eternidade vítimas da cólera e afogamento. É a arte e a cultura a exercerem o seu papel na vida das pessoas e das comunidades, movendo montanhas.